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Sulcos



soutine

É algo tão específico, um violão de sete cordas, de madeira de jacarandá. Seria essa uma das minhas obsessões? Tenho algumas tantas, e outras tão poucas que olho pro prato de comida, e não esta completo. Os nutricionais diriam que meu prato de comida não falta especiarias, mas sempre falta! Pois fico entre hemisférios e oceanos, cidades, rotas, trilhas e, claro, sonhos.
Hoje saio na rua com a cabeça erguida, e não com os olhos fugidios de quem fez algo de errado na noite anterior. É como se diz na gíria, amarra a bandeira na cabeça, e pela pátria. E meu país, próprio precisa sorrir. No caso o riso vem pelo sabor, o sabor dos outros é tão melhor misturados aos meus.
Será que me tornei um produto, como tantos corpos? Ou fiz desses outros corpos um produto?
“- Sabe do que eu gosto no conto? A falta de compromisso. É tudo muito rápido, sem formalidades, sem muito tempo gasto com apresentações e futilidades. É como um encontro casual, que dura só aquele tempo e durante aquele tempo é bom. Sem aprofundamento nem grande envolvimento... O que faz tudo ficar mais fácil”.
- Eu lhe diria que isso se chama poesia, e não conto! Pois contos não têm tamanhos, podem ter vinte e três páginas e ser um conto, podem ter vinte e dois personagens e ser um poema épico. Adoro os épicos, na minha vida eles têm duração de contos, mas tem mais significância do que qualquer extensa e longa história eterna.

Tudo é eterno!

E ao ver, o dedilhar dos dedos nas cordas do violão, sei porque as mãos falam mais do que qualquer parte do corpo. Mãos falantes dos músicos e escritores, que contém mais informação do que suas palavras escondida em silêncios. São mãos cantantes, que cantam nos corpos das pessoas. É nesse momento que aplico a famosa expressão:
corpo de violão. Agora se precisa encontrar quem os faça vibrar em harmonias diferentes.
Das duas noites, de janelas e espaços distintos, se vê o Cristo de costas. Será que ele se envergonha da minha falta de castidade, ou protege minha noite sob os lençóis? Prefiro pensar que ele protege meus pecados e os aceita, pois até Madalena merece respeito, porque as que deitam comigo não devem ter?
Como um Nabokov tupiniquim poderia ficar ali olhando aquela convulsão de palavras e simplesmente me perder nas curvas dos seus “as” e na forma como sua boca fecha na pronuncia dos “us”, quando canta, assim como suas mãos, sinto as notas friccionarem meu corpo com alguma violência ou nenhuma dependendo da rapidez que estão nossas intenções permeadas de rimas e versos. E sentir nossas reações exotérmicas liberando suor. Gosto do sal corporal. [É o melhor remédio para a alma]. Parece que sempre choro? Sim! Choro até mais do que devia, pois gosto das coisas que devem ser experimentadas com temperos. Só que, aprendi a não chorar e não sofrer por antecipação. Pois de salgada só quero minha saliva a percorrer as várzeas dos multicorpos.
Mas de volta as cordas, que nos ligam invisivelmente, como numa cena fixa na minha mente, como se nós fossemos manipulados como fantoches, recobertos por uma nuvem de desejos irreprimíveis, que se saciam em quatro paredes, cantos escuros, becos... Ou não se saciam! Como é meu caso. E pós a festa pagã e obrigação cristã se resguardar de algo, mas eu não me resguardo de uma gota dos pecados permitidos ao nosso livre arbítrio.
"Tudo isso me deu, não poucas vezes, uma gana louca (daquelas que só o humano desejoso sabe como é) de transformar o conto num romance (e dos bem melosos). Tinha horas em que me sentia inspirada e achava tudo possível. Quem sabe até um épico decassílabo, por que não? Mas, quando acabou (sim, já acabou, assim mesmo, sem mais), concluí (aliás, acho que li muito Esopo na infância, porque as minhas narrativas sempre têm uma moral no fim --- já os parênteses, não sei de quem herdei) que foi melhor ter resistido à tentação e ficado só no conto mesmo. Assim, sem apego, sem "eu te amo", bom durante o enquanto (e nem tanto quanto naquele soneto, mas, ainda assim, bom), não restou nem muito suspiro nem muita saudade. Tudo mais fácil".
Acho que não é moral que procuro, nem romance, nem facilidade, é simplesmente a sensação de te ter nos braços e falar mais que palavras. Fazer, sim, dos pequenos poros partituras com mordidas, arranhões e beijos. É assim que se recobre o corpo das cinzas pela quarta que passa.

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