Isso mesmo. Eu sou esse espírito vagabundo que faz traquinagens para que
meu amo fique alegre.
PUCK – Sonho de Uma Noite de Verão, Shakespeare.
Como se
fosse fácil assim, fazer sorrir quem amo. Tento, enfeito de flores os cabelos
das ninfas, perfumo com rosas as palavras, me embrenho nos jogos de amor de
Oberon e Titânia. No entanto, fazer sorrir meu amor, impossível é. Hoje, já não
sei que rosto tem, qual voz emprega se sente saudade de mim. Cada dia que
passa, o semblante fica mais disforme, e eu procuro alguém que se encaixe a
essas noites de vindouro Inverno. Esperando quem sabe um verão mais delicado,
para esse coração maltrapilho.
Não se
engane, apesar dos olhos tristes, sei fazer multidões sorrir, e sei fazer
certos olhares se apaixonarem, pelo primeiro sorriso encantador que surgir.
Mas, essa mágica eu não trago para mim, não há romance, encantamento que dure.
Sigo,
sendo esse espírito. Lembro, lembro, do tempo que minhas traquinagens inofensivas
faziam alguns cantarem e se embriagarem ao gosto do vinho, nas danças das belas
moças. E eu, era de tudo naquele teatro de cores, também era rei, também era
bobo, também era enamorado. Não por uma, mais por muitas vozes, cheiros, cores,
histórias.... Como era encantado para mim, me sentar naquele bosque e contar e
ouvir os milhares de palavras e amores, até aqueles que não percebemos ser amor.
Como o caso de Alice e o Chapeleiro. Nunca se perguntou, se ela não fosse uma
menina curiosa e ele não fosse um senhor... Mas, a mais interessante de todas
elas são justamente as trocas que Oberon e Titânia fazem, com os mortais.
Enquanto um sopra palavras de amor, o outro sopra dúvida no coração do
escolhido, e assim sobra a mim, o papel de fazer comédia da tragédia, essas
pequenas tragédias de amor, que só os mortais se dão a interpretar e a sofrer e
chorar...
Ahhhh como
seria, se eu não tivesse contraído esse vírus, não estivesse a andar nas ruas a
procura, procura daquela que me coloque nas nuvens, que me faça rir da minha
própria risada, que não se importe com as distâncias geográficas, que
compreenda que meu mundo é mais inteiro quando o mantemos encantado. Que uso
preto, mas minh’alma é uma explosão de tintas que ela poderá pintar quantos
mundos quiser. Ahhh como seria se eu não fosse, o que sou, e não me chamasse...
Puck! Puck! Venha aqui – diz Oberon.
Eu parto,
para dar a volta ao mundo, para servir ao meu senhor, para que ele brinque com
o único brinquedo que pra mim é precioso e não posso usar...
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